Direito Condominial e Sindicatura - Amanda Accioli
Advogada pós-graduada em Direito Empresarial (Mackenzie) e em Direito Público (Federal Concursos). Possui formação complementar na área condominial, como de Administração Condominial e Síndico Profissional, de Direito Condominial e de Direito Imobiliário, todos pela Escola Paulista de Direito (EPD), entre outros. Tem experiência como advogada condominial nas áreas consultiva e contenciosa, atuando hoje como síndica profissional e como prestadora de serviços na área consultiva condominial para grandes escritórios jurídicos.
Sindicos Condominiais: despertem o seu compliance interior!
Para quem já estudou algo sobre compliance, já entendeu que sua origem vem do verbo em inglês “to comply” o que, pensando dentro do mundo condominial, nos remete à idéia de cumprimento de regras, normas e leis que cuidam destes micro organismos vivos chamados condomínios, e que estar atuando em compliance, é estar “em conformidade” com todas estas ferramentas condominiais.
Há alguns anos, com o início da “Operação Lava Jato” e entre outras medidas que ajudaram a desmontar os esquemas de corrupção naquele momento em nosso País, tivemos alguns bons desdobramentos e um deles foi o maior interesse da nossa população pelas questões sobre ética e transparência, e desde então, não só as pautas dos governos, mas também das empresas, eram ter uma gestão correta e transparente.
E foi nesse contexto também que surgiu a importância do compliance condominial, afinal a única coisa que difere um condomínio de uma empresa é ele não ter fins lucrativos, porém as demais nuances são iguais: contratam empregados, pagam impostos, possuem gestão de pessoas, gestão financeira, de RH e tantas outras.
No mundo em que vivemos hoje, o fato de um gestor condominial agir dentro dos regramentos condominiais com transparência e equidade, pode passar a ilusão para a massa condominial, que ele eliminaria por completo, todos os atos ilícitos em todas as camadas ali existentes, porém, é difícil conseguir isso “logo de cara” ainda mais se naquele condomínio todos estavam acostumados a agir e à trabalhar sem transparência ou ética por muitos anos; o trabalho é árduo e não é do dia para a noite que a mentalidade da comunidade condominial irá mudar, porém quanto mais o Síndico, que é o maior responsável e o maior exemplo de comportamento ali dentro, agir de forma inequívoca e transparente, mais ele terá chances de minimizar as ocorrências maléficas e, caso estas sejam identificadas logo no seu início, poderão ser devidamente tratadas desde o seu início e consequentemente mitigadas, além do que o Síndico estaria dando um grande exemplo à todos aqueles que ali diariamente reportam à sua gestão, direção e treinamento, afinal é ele o responsável dentro do condomínio por manejar diferentes recursos e lidar com questões sensíveis e complexas que envolvem os condôminos, seus colaboradores e o próprio empreendimento. É o Síndico o grande comandante da nau, e suas direções são seguidas por todos.
Então, quando o Síndico de um condomínio desperta o seu compliance interior, é como se ele “virasse a chave” de boa parte da comunidade que ali vive: sua gestão contagia a todos e os seus princípios são seguidos, e quem tenta sair das regras, se sente acuado, sem vazão para os seus atos inadequados.
Vou dar um exemplo: quando assumi um novo condomínio em dezembro de 2021, um condomínio que infelizmente teve seu último Síndico destituído do seu cargo e que agora sofre ação judicial em decorrência dos resultados de uma pesada auditoria, alguns dos prestadores de serviços logo correram para marcar uma reunião com a nova Síndica (no caso, eu) para dar, segundo eles, “continuidade no bom relacionamento que mantinham com o antigo gestor” e mais, que um deles abertamente me confidenciou, para que continuasse “financeiramente interessante para ambas as partes”; neste momento, com poucos dias de mandato, eu ainda não tinha um programa de compliance implantado, mas por “ser compliance”, e isso explicarei mais para frente, com a uma postura firme, encerrei o assunto com aquelas empresas já demonstrando que o tipo de gestão dali em diante naquele condomínio seria pautada na honestidade e na transparência. Daquele dia em diante, todos os prestadores de serviços mudaram seus comportamentos comigo, e os colaboradores diários do condomínio também (acredito que as notícias correram rápido, e vejam, assim como correm para o bem, também correm para o mau).
Sim, é então o Síndico o líder deste grande e importante processo interno, é ele a figura mais importante, o maestro que orquestrará toda a sinfonia condominial composta por empregados (orgânicos ou não), terceirizadas, condôminos, prestadores de serviços em geral, corpo diretivo (fiscal e consultivo), fornecedores e alguns outros tantos, e por isso o Síndico deve ser o primeiro a ter uma postura de compliance, pois é ele que puxará toda a massa condominial atrás dele.
Por isso Síndico, faça despertar sempre o seu compliance interior, antes de qualquer contratação de empresa ou escritório especializado na área.
Quando o Síndico adota uma postura de compliance dentro do seu condomínio ele já eleva sua postura e o seu próprio condomínio à outro patamar, demonstrando um comprometimento com a transparência e a ética, chamando para si todos aqueles que farão parte desta nova estrutura condominial.
Agora vou explicar o que escrevi lá nos primeiros parágrafos e para isso homenageio uma amiga e profissional do mercado condominial a Dra. Társia Quilião, advogada especialista em compliance condominial, que nos explica muito bem a importância do Síndico nesse processo – e ela afirma, o que eu concordo “ipsis litteris”, que antes de qualquer implementação de uma nova estrutura interna dentro de um condomínio, que hoje pode ser realizada por grandes empresas e escritórios que são contratados especialmente para este trabalho, que nada irá adiantar se o “comandante deste navio” chamado “Síndico do Condomínio” não for compliance. Mas como assim? O síndico tem que estar agindo sob o processo de compliance ou ele deve ser compliance? Os dois!
Explico: como o Síndico é o líder deste processo, o mais importante é ele SER compliance, é ele, o Síndico, pensar com ética, pensar em suas ações em conformidade com o que é correto, com o que está dentro das normas e regramentos daquela comunidade condominial, pensar sempre dentro da responsabilidade civil, criminal, tributária, trabalhista e acima de tudo moral, ética e atuando dentro da total transparência.
Em resumo, se o Síndico, seja ele orgânico ou profissional, não for compliance, de nada valerá ele contratar o melhor escritório para implementar este procedimento em seu condomínio, pois os objetivos não serão comuns e trabalharão internamente em direções contrárias.
Portanto, é responsabilidade sim do Síndico a promoção do compliance dentro do condomínio, à começar pela sua postura, sendo ele compliance em seu dia a dia, criando consciência não só entre os condôminos mas também entre os colaboradores e todo o Corpo Diretivo, para que todos possam enxergar com a mesma lente da ética, a mesma ótica das conformidades, fomentando um ambiente propício às práticas legais, e evitando assim o que são nossos maiores escopos dentro do compliance condominial: os desvios de valores, as contratações irregulares e os gastos desnecessários.
Diante de toda essa explicação não tenho como não apelar aos meus Colegas Síndicos para que, ao assumirem a gestão de um condomínio: despertem o seu compliance interior!
Despertado o seu compliance interior, será normal o Síndico se interessar sempre em saber quem são e como agem seus parceiros de negócios, como eles atuam no mercado, se cumprem ou não as Leis, como tratam seus clientes e colaboradores, como são suas atitudes perante terceiros, se pagam em dia seus impostos e seus funcionários, entre outros detalhes que podem colocar em risco a reputação do contratado e até mesmo a dele como Síndico, como contratante, afinal, você já ouviu aquele ditado: "me diga com quem andas que te direis em és?", pois é, qualquer falha, qualquer deslize, pode manchar para sempre a reputação e deixar aquele condomínio desvalorizado na região onde se encontra localizado.
Hoje em dia o Síndico deve viver o compliance e fazer com que este seja um exercício diário de processos dentro do condomínio, e nunca se esquecer que, despertar o seu compliance interior vai muito além de números, é ter valores éticos e morais intrínsecos entre toda a massa condominial.
Não bastam Síndicos honestos no mercado condominial, hoje eles precisam mostrar um trabalho constante e incessante através de processos transparentes, honestos, éticos e estruturados como sendo o novo o normal.
Infelizmente ainda vejo muitas empresas na capital paulista onde vivo e trabalho como Síndica Profissional, se espantarem ao encontrar pelo caminho Síndicos que “agem compliance”, sendo éticos, honestos e transparentes, o que me causa muita indignação, afinal por quantos anos nossos condomínios viveram sob a égide de gestões abusivas e desonestas para que o honesto hoje cause espanto e até certo desgosto por algumas empresas quando percebem que aquele Síndico não lhe dará o trabalho de forma direta via bonificação de venda do seus serviços?
Como escrevi acima, não será do dia para a noite que a mentalidade de uma comunidade, mas como Síndicos e gestores responsáveis pela massa condominial que somos, devemos acreditar e dar exemplos: começar a encabeçar em cada um dos nossos condomínios uma postura de compliance com muito comprometimento, transparência e ética, procurar por empresas sérias e tão comprometidas como nós para os relacionamentos e atendimentos diários do condomínio, e se possível realizar a contratação de um escritório que possa implementar todo o procedimento de compliance no condomínio de forma séria e segura, e lembrando que para isso, será crucial a parceria dos conselheiros, dos condôminos e dos colaboradores, desde o mapeamento assertivo do condomínio (pois cada condomínio é um organismo vivo e único e vai necessitar de um programa específico) até a implementação do procedimento.
Como Síndica Profissional, eu desperto um pouco mais do meu compliance interior a cada condomínio que assumo e fico muito satisfeita em saber que hoje podemos contar com esta ferramenta tão importante para a gestão dos condomínios e que pode ser implantada por escritórios idôneos para mitigar a maioria dos conflitos, das fraudes e das corrupções no âmbito dos prédios por todo o nosso Brasil; contribuir de modo preventivo e efetivo frente à tantas exigências que o gestor condominial possui, levando uma gestão preventiva e humanizada, reduzindo conflitos e custos, é a grande diferença do Síndico que trabalha com compliance mas acima de tudo, daquele que trabalha tendo despertado dentro de si todos os princípios do compliance.
Bibliografia:
SCHWARTZ, Rosely Benevides de Oliveira. Revolucionando o Condomínio: Saiba se seu condomínio é bem administrado, 15ª ed. Revisada e atualizada. São Paulo, editora Saraiva, 2017, 380 páginas.
FRANCO, J. Nascimento. Condomínio. 5. Ed. revisada e atualizada e ampliada. São Paulo, editora Revista dos Tribunais, 2005.
QUILIÃO, Tarsia Smeha. Compliance Condominial. E-book InfoSindico.com.br, www.infosindico.com.br, 2020, 32 páginas.